Eu moro numa cidade cheia de praias. Uma delas recebeu nos últimos tempos obras de melhorias. E ficou extremamente bonita. Era uma quarta-feira. Eu tava saindo do banco, era um dia sem sol. Ideal pra uma caminhada preguiçosa, um passeio a dois. Havia um casal. Aproveitando aquela tarde maravilhosa. Duas meninas. Deitadas, abraçadas. Aos beijos.
A minha reação foi RIDÍCULA.
Rindo feito uma hiena demente eu procurei um interlocutor pra comunicar aquele exotismo: ” alá as sapatão se pegando “
Antes de fazer tal sandice eu me dei conta da imbecilidade do meu ato.
Eu não tava vendo uma girafa azul.
Era um casal namorando. Onde tá o exotismo ?
Acontece que eu nunca tinha visto aquilo antes. Eu nao moro em Amisterdan , nem em NovaYork. Nem em Paris.
Moro em Vitória. No Brasil. Um país bem esquizofrênico. Que ao mesmo tempo que exporta bundas e é famoso por ter a maior pagã do Planeta ( Carnaval é um festival pagão amiguinhos ) é um pais católico, conservador, moralista e hipócrita.
Então eu não nunca tinha me deparado com aquilo antes: Uma tremenda quarta-feira, a luz do dia, no calçadão da praia, duas meninas se beijando.
Dos direitos negados. Da invisibilidade forçada.
Das reações que em tese não conjecturam homofobia mas favorece imensamente pra que a homofobia continue bombando.
Da falta de modelos sociais em que possamos nos espelhar. Nos que somos gays e simpatizantes acabamos por compactuar com a visão que a sociedade em geral tem de nós.
Há um jeito de ser gay. O jeito CERTO. [ determinado por eles, obviamente nunca por nós mesmos ]
E dai até mesmos os gays acham bacana dizer: “olha é legal ser viado, mas POR FAVOR NÃO PAREÇA VIADO “
E nem nos damos conta que nesse discurso estamos perpetuando o conceito que qualquer manifestação sexual que não hetero só deve ser externada entre quatro paredes. Longe da vista desse pessoal bacana que veja só, já permitiu que a gente fosse gay.
Se além de ser gay a gente também quiser qualquer coisa a mais já é um abuso. Vamos caçar nossa turma e ficar quietinhos no nosso lugar que é longe da vista de todo mundo.
Os gays em geral são acusados de serem promíscuos, infiéis e voluveis.
Mas ninguem se lembra que pra um relacionamento intimo entre duas pessoas se validar ele precisa do aval do cotidiano. Que nos é negado.
São pequenas coisas que vão lentamente aproximando e solidificando esse vinculo.
Um olhar. Um afago. Um beijo roubado. As mãos dadas em apoio. Um abraço demorado depois de uma crise de ciumes sem fundamento.
Tudo isso nós é negado.
Você que é hetero tenta imaginar como seria conquistar aquela paquera do cursinho sem nenhum desses recursos. Boa Sorte.
P.S: por acaso eu tinha uma foto do banco onde as moças estavam deitadas. Essa que ta ai no post.
Neam ?
Depois ninguem sabe pq os gays nao PROCRIAM.
“Mas ninguem se lembra que pra um relacionamento intimo entre duas pessoas se validar ele precisa do aval do cotidiano. Que nos é negado.”
Precisamos saber disso.
Bem, aqui em Curitiba tá rolando um fenômeno sapatístico, não sei se é assim em todo canto, mas pelo que vc conta, não – é que tá cheio de casal de meninas na rua. Bastante, mesmo, coisa de ver assim um por semana. Outro dia eu estava no carro com a Nina (quase 6, pra quem não sabe), e ela – olha, mamãe, duas meninas se beijando. Daí falei é mesmo, viu, elas se gostam, tem meninas que gostam de meninas etc.
Sei que fiquei bem feliz de constatar isso e comentei com colegas, que foram bem duras: “agora tá na moda, é influência desses ídolos da música, elas nem sabem do que gostam ou o que querem”. Uau, ok, mas que bom, né, se sentir bem pra experimentar.
Por outro lado, com relação aos meninos gays, Curitiba é a capital com maior número de agressões e até mortes, se não me engano.
Bjk.
As meninas mais novas estão com o gás todo. Eu curto isso.
Os meninos parecem cansados. Estao querendo outras coisas. Não sei o que ainda.
Como moro em Copacabana, vejo de tudo todos os dias, cenas de namoro homo e heterossexual e nada me choca. Vejo um mar verdinho e, na pressa, nem sempre o percebo.
Vejo gente morando nas ruas, crianças cheirando cola, mas também não me choco, pois são 17 anos vendo isso todos os dias. A repetição das cenas faz com que a gente absorva o impacto e passe a achar tudo parte da paisagem.
O que ainda me choca horrivelmente é ir ao banco e ver alguém usando somente sunga, no máximo uma camisetinha por cima. Sempre com barrigões por baixo. Isso me choca e me deprime, mas finjo que não vejo.
copacabana e mais free neam ?
mas será que esse povo que se pega e dai mesmo ou ta de passagem ?
pq existe uma diferença. Na cidade dos outros a gente costuma chutar o pau da barraca e aloprar.
Na nossa cidade rola o perigo de topar com a tia careta no meio da rua. Dai e melhor ter mais cuidado.
Interessante.. tu começou a descrever e eu imediatamente imaginei o casal homem + mulher. A gente se prende a certos esteriótipos e segue neles sem nem pensar a respeito, né?. E são tantos…
Tenho amigos gays que evitam demonstrações amorosas em público, mas também tenho amigos que fazem questão de demonstrar afeto onde quer que estejam.
Confesso que vibro a cada demonstração de afeto deles e que eles me ensinam a cada dia que passa.
Quem sabe um dia a gente tenha um mundo que ame mais, elogie mais e critique menos… eu tenho tentado, mas nem sempre consigo..
Teus textos sempre me fazem pensar, obrigada 🙂
Eu tambem tento. Mas as vezes escapole esse ranço de algum lugar que eu nem sabia que tinha. Normal. A gente leva uma vida inteira pra aprender a ser babaca. Não é de uma hora pra outra que deixaremos de ser né ?
obrigado vc, es sempre uma fofa. 🙂
Meu bem, que texto incrível.
Acho que não há muito o que dizer depois de lê-lo e ao da Lilah.
Mas acho que falta por parte dos gays uma postura menos comodista quanto a isso. Assim, nós somos os primeiros a nossos discriminarmos e como alguém pode nos respeitar e nós mesmos não damos os exemplos?
^^
Eu acho que estamos em momentos diferentes como a tina lopes bem citou. As meninas estao mais empenhadas nisso de se tornar visivel. Os meninos meio que estao sem rumo. Acho.
adorei o texto. Só pra deixar um texto bacana , não sei se você já leu, é da Milly Lacombe http://revistatpm.uol.com.br/revista/102/colunas/na-mesa-do-jantar.html
Não tinha lido. Eu não sou muito fã da Milly. Mas gostei do texto. Obrigado. 🙂
[…] é um mito que os gays sejam mais ou menos promiscuos que qualquer pessoa. Você pode discordar de mim e da Lilah que não somos ninguém no baile. Mas quero ver você ter coragem de discordar do E. M. […]